Reflexão :
"Engraçado pensar que o modelo de sucesso da geração
dos nossos avós era uma família bem estruturada. Um bom casamento,
filhos bem criados, comida na mesa, lençóis limpinhos. Ainda não havia
tanta guerra de ego no trabalho, tantas metas inatingíveis de dinheiro.
Pessoa bem sucedida era aquela que tinha uma família que deu certo.
E
assim nossos avós criaram os nossos pais: esperando que eles cumprissem
essa grande meta de sucesso, que era formar uma família sólida. E
claro, deu tudo errado. Nossos pais são a geração do divórcio, das
famílias reconstruídas (que são lindas, como a minha, mas que não são
nada do que nossos avós esperavam). O modelo de sucesso dos nossos avós
não coube na vida dos nossos pais. E todo mundo ficou frustrado.
Então nossos pais encontraram outro modelo de sucesso: a carreira.
Trabalharam duro, estudaram, abriram negócios, prestaram concurso,
suaram a camisa. Nos deram o melhor que puderam. Consideram-se mais ou
menos bem sucedidos por isso: há uma carreira sólida? Há imóveis
quitados? Há aplicações no banco? Há reconhecimento no meio de trabalho?
Pessoa bem sucedida é aquela que deu certo na carreira.
E assim
nossos pais nos criaram: nos dando todos os instrumentos para a nossa
formação, para garantir que alcancemos o sucesso profissional. Nos
ensinaram a estudar, investir, planejar. Deram todas as ferramentas de
estudo e nós obedecemos. Estudamos, passamos nos processos seletivos,
ocupamos cargos. E agora? O que está acontecendo?
Uma crise nervosa.
Executivos que acham que seriam mais felizes se fossem tenistas.
Tenistas que acham que seriam mais felizes se fossem bartenders.
Bartenders que acham que seriam mais felizes se fossem professores de
futevolei.
Percebemos que o sucesso profissional não nos garante a
sensação de missão cumprida. Nem sabemos se queremos sentir que a missão
está cumprida. Nem sabemos qual é a missão. Nem sabemos se temos uma
missão. Quem somos nós?
Nós valorizamos o amor e a família. Mas já
estamos tranquilos quanto a isso. Se casar tudo bem, se separar tudo
bem, se decidir não ter filhos tudo bem. O que importa é ser feliz.
Nossos pais já quebraram essa para a gente, já romperam com essa
imposição. Será que agora nós temos que romper com a imposição da
carreira?
Não está na hora de aceitarmos que, se alguém quiser ser
CEO de multinacional tudo bem, se quiser trabalhar num café tudo bem, se
quiser ser professor de matemática tudo bem, se quiser ser um eterno
estudante tudo bem, se quiser fazer brigadeiro para festas tudo bem!
Afinal, qual o modelo de sucesso da nossa geração?
Será que vamos continuar nos iludindo achando que nossa geração também
consegue medir sucesso por conta bancária? Ou o sucesso, para nós, está
naquela pessoa de rosto corado e de escolhas felizes? Será que sucesso é
ter dinheiro sobrando e tempo faltando ou dinheiro curto e cerveja
gelada? Apartamento fantástico e colesterol alto ou casinha alugada e
horta na janela? Sucesso é filho voltando de transporte escolar da
melhor escola da cidade ou é filho que você busca na escolinha do bairro
e pára para tomar picolé de uva com ele na padaria?
Parece-me que
precisamos aceitar que nosso modelo de sucesso é outro. Talvez uma
geração carpe diem. Uma geração de hippies urbanos. Caso contrário não
teríamos tanta inveja oculta dos amigos loucos que “jogaram diploma e
carreira no lixo”. Talvez- mera hipótese- os loucos sejamos nós, que
jogamos tanto tempo, tanta saúde e tanta vida, todo santo dia, na lata
de lixo."
_______________Ruth Manus
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